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'Essa ideia da sociedade de que ninguém presta é muito perigosa', diz Boris Fausto

Aos 86 anos, o historiador e cientista social, Boris Fausto já viveu - e relatou - diversos momentos políticos do Brasil. Desde a ditadura de Getúlio Vargas nas décadas de 1930 e 1940, passando pelo período militar em 1964, o impeachment de Fernando Collor em 1992 e, mais recentemente, o de Dilma Rousseff em 2016.
No entanto, nenhum deles se compara ao momento que o país está vivendo agora, diz ele - especialmente após as denúncias divulgadas pelo jornal O Globo afirmando que, segundo gravações feitas por dono da JBS, Joesley Batista, o presidente Michel Temer teria dado aval a pagamento para silenciar o ex-deputado Eduardo Cunha, que está preso. O peemedebista nega a acusação.
"Nunca antes na história desse país houve uma crise tão grande e tão dramática", descreveu Fausto em entrevista à BBC Brasil.
A situação piorou ainda, para ele, com o pronunciamento de Temer negando veementemente tanto as acusações, quanto a possibilidade de renúncia. "Acho que isso, de certo modo, piora porque prolonga essa situação. Mas é de se imaginar que ele queira ganhar tempo pra ver em que pé isso fica. É uma situaão extremamente delicada, está um espetáculo."
O historiador não vê uma solução clara para acalmar essa crise que assola o país "há dois, até três anos". No entanto, ele classifica como "perigosa" a tendência de rejeição à política que tem surgido diante de todas as denúncias trazidas à tona pela operação Lava Jato.
"O problema da sociedade, é essa ideia de que 'ninguém presta'. Essa ideia é muito perigosa. Ela abre um espaço muito perigoso. As pessoas começam a se perguntar: então quem presta?", indagou.
"Nessa hora, os salvadores aparecem no imaginário das pessoas."
Autor de "História do Brasil" e ganhador do prêmio Jabuti de 1995, Boris Fausto não consegue ver correlação histórica direta deste momento com qualquer outro pelo qual tenha passado a política brasileira. No entanto, a gravidade da situação, para ele, lembra os anos vividos antes do golpe militar, instituído em 1964.
"Essa crise é a mais grave que já vivemos, não vejo nenhuma outra semelhante a ela. Mas uma conjuntura tão grave assim foi a que vivemos nos anos que precederam o golpe militar", pontuou ele.
Apesar disso, Fausto reitera que não vê qualquer chances de uma nova ditadura militar ser instaurada neste momento - isso porque o Exército não teria tanta voz hoje, como tinha no passado. No entanto, ele alerta para alguns cenários que poderiam contribuir para o agravamento ainda maior da crise política, que poderia aí abrir uma possibilidade de mudança desse quadro.
"Até hoje, as especulações não estão em torno do Exército. Não existe nenhuma conversa entre generais ou qualquer coisa que possa ser indício disso. Mas eu temo que a gente possa chegar a uma situação que mude esse quadro, que empurre militares para intervenção."
Perguntado sobre qual seria essa situação, ele afirmou: "Uma situação de caos social, de desentendimento completo, as manifestações de rua escaparem dos limites. E a polarização contribui para isso. Seria muito triste, mas pode ocorrer."