BEBES SÃO TRATADOS COMO CRIMINOSOS EM PRESÍDIOS OU DELEGACIAS.

Absurdo absorver a triste realidade onde crianças nasçam ou são detidas em delegacias ou presidios femininos por crimes praticados por sua genitora. Estes casos recentes demonstram a crueldade com a vida de inocentes que já nascem pagando por um crime que não cometeu. nascer de uma mãe acusada ou criminosa.
A Bahia tem atualmente 58 mães presas, com filhos entre 2 e 12 anos. O número é da Secretaria Estadual de Administração Penitenciária e Ressocialização (Seap). Grande parte delas não tem visto as crias atravessarem a infância ou chegando à adolescência. Apesar de a lei de execução penal determinar que as penitenciárias femininas tenham berçário e creche para garantir que as crianças estejam do lado das mães até os sete anos, isto nem sempre acontece na prática. Em Salvador, por exemplo, as detentas são obrigadas a se afastar dos filhos aos seis meses de idade, por causa da falta de estrutura para recebê-los por mais tempo. Segundo a Seap, o estado não tem nenhuma mãe presa com filho até seis meses. Por outro lado, sete internas possuem crianças em idade de lactação - até os dois anos. O debate sobre as mães presidiárias ganhou atenção da sociedade nos últimos meses. Primeiro, após a ex-primeira-dama do Rio de Janeiro, Adriana Ancelmo, conseguir na Justiça o direito a ter prisão domiciliar, para que pudesse cuidar do filho menor de 12 anos. A questão provocou polêmica porque o Ministério Público Federal (MPF) argumentou que, no Brasil, há milhares de mães na mesma situação de Adriana, mas sem o mesmo benefício que ela. Nesta Quarta-feita de Cinzas (14), um outro caso de mãe encarcerada chamou a atenção do país. Desta vez, sem o mesmo desfecho que teve Adriana. Com apenas três dias, o filho de Jéssica Monteiro, de 24 anos, ficou preso com a mãe em uma distrito policial de São Paulo. Ela foi detida junto com o marido por tráfico de drogas, ao ser flagrada com 90 gramas de maconha. Jéssica entrou em trabalho de parto no domingo, quando estava prestes a participar de uma audiência de custódia que poderia lhe dar a possibilidade de responder o processo em liberdade. Mesmo com essa situação, o juiz responsável pelo caso decidiu mantê-la presa. Depois de dar à luz, Jéssica voltou para a carceragem com o bebê, uma cela de dois metros quadrados, suja, com mau cheiro, dormindo em uma espuma no chão com alguns cobertores, isolados dos outros presos. A situação, que aos olhos dos direitos humanos beira o absurdo, suscitou uma discussão: até quando vale submeter uma mãe à rigidez da lei penal e obrigar uma criança, em seus primeiros dias de vida, a viver a realidade da falta de estrutura do sistema prisional brasileiro? Para a professora de Direito Penal e Direito Processual Penal, Daniela Portugal, o risco a que mãe e filho estão submetidos é muito alto. Em entrevista ao Bahia Notícias, ela afirmou que submeter a criança à vivência do cárcere pode provocar nelas grandes impactos. “Quem sofre a pena é a mãe, e não a criança. Existe a necessidade de se criar mecanismos para que somente a mãe, e ninguém, sinta os efeitos da privação de liberdade. Pode-se admitir uma prisão domiciliar nesses casos, como forma de minimizar os impactos. Ele não vai conseguir anular, mas vai amenizar os impactos para a criança”, defendeu Daniela.
A professora apontou para a necessidade de enxergar o perfil dessas detentas. Dados do Levantamento Nacional de Informações Penitenciárias (Infopen) divulgado em 2015 pelo Ministério da Justiça, mais da metade das mulheres presas é pobre e negra. Mais da metade delas também foi privada da liberdade por tráfico de drogas. No entanto, apontou Daniela, grande parte das presas por esse crime nunca assumiu papel de liderança em facções, apenas ocupando funções secundárias. Algumas nem mesmo praticaram nenhum delito. Assumiram a culpa apenas para preservar os companheiros. Não à toa, um percentual expressivo dessas mulheres é formado por rés primárias. Diante disso, a advogada defendeu que a aplicação da lei seja proporcional ao pouco potencial ofensivo do crime cometido. “Já estamos diante de uma pessoa que sofre um processo de exclusão social mesmo antes de cometer qualquer tipo de delito. Em muitos casos, a necessidade de sustentar uma família já é razão da delinquência. O estado precisa olhar para isso. De alguma forma, para minimizar os efeitos do cárcere para esta mulher, para que ela tenha condições de acolher esse filho ou filha. O estado não pode usurpar a função da mãe de criar os filhos. Não faz sentido nenhum impor que essas mulheres estejam em celas”, criticou. Ainda segundo Daniela, não é necessário mudar a estrutura das penitenciárias para que as crianças tenham mais conforto ao ficar no mesmo espaço das mães. Ela voltou a defender a prisão domiciliar como solução. “Sou absolutamente contrária a mudanças estruturais no sistema penitenciário. Isso gera um custo público diante de outras possibilidades mais adequadas. Precisamos pensar em prisões domiciliares e, se não houver residência fixa, pensar em formatos de acolhimento, não pautados em moldes prisionais”, sugeriu. Ela ainda propôs analisar o sistema prisional brasileiro sob um “recorte de gênero”. ”Estamos diante de uma série de fatores de vulnerabilidade que se somam. O sistema punitivo precisa olhar para isso. Precisa analisar a prisão dentro de um recorte de gênero para avaliar como essas mulheres são posicionadas dentro da sociedade, porque elas estão na base da sociedade, e como se posicionam dentro do sistema prisional”. Ela também criticou a lógica usada no caso de Adriana Ancelmo, quando muitos defenderam que um direito previsto fosse retirado, já que outras mulheres não possuíam o mesmo. Para a advogada, é necessário pensar em estender benefícios. “Em nome da igualdade, querem estender sacrifícios de direitos fundamentais. Em nome da igualdade, precisamos estender benefícios e garantias fundamentais. Em nome da igualdade, não vamos negar o benefício, precisamos coletivizar esses benefícios. Se um tem, que todos tenham”.

Recém-nascido fica em cela com mãe que foi presa pouco antes de dar à luz em SP

Um bebê recém-nascido foi levado junto com a mãe para a cela de uma delegacia de São Paulo nesta terça-feira (13). Jéssica Monteiro, de 24 anos, tinha sido presa pela Polícia Militar por tráfico de drogas na manhã de sábado (10). Como ela entrou em trabalho de parto um dia após ser presa e em audiência de custódia juiz decidiu por manter a prisão, ela precisou voltar para a cela da delegacia com criança após receber alta do hospital. Jéssica entrou em trabalho de parto no domingo (11), quando foi levada escoltada para o Hospital Municipal Dr. Ignácio Proença de Gouvêa, na Mooca, na Zona Leste de São Paulo. Nesta terça-feira (13), dois dias após dar à luz, ela foi liberada do hospital e levada novamente para a carceragem do 8º DP, região central de São Paulo, onde permaneceu na cela. Ela deixou o local na tarde desta quarta-feira (14), quando foi levada para Penitenciária Feminina de Santana, onde ficará no berçário. Em nota, a Secretaria da Administração Penitenciária informou que Jéssica vai ficar no Pavilhão Materno - Infantil , específico para mães e recém-nascidos. A rotina diária das mães nestas unidades é voltada para o exercício da maternagem. Elas também possuem área de amamentação, creche, destinadas aos bebês a partir dos quatro meses." A Secretaria da Segurança Pública (SSP), por meio de nota, informou que após o retorno de Jéssica à carceragem do 8º DP, "seu processo de transferência foi iniciado, sendo concluído nesta quarta-feira (14). A SAP esclarece que a detenta está no Pavilhão Materno Infantil da Penitenciária Feminina da Capital, que conta com atendimento especializado para recém-nascidos e bebês que estão em período de aleitamento materno".
Bebê recém-nascido passou a noite com a mãe numa cela da delegacia do Brás
Bebê recém-nascido passou a noite com a mãe numa cela da delegacia do Brás
De acordo com o advogado dela, Paulo Henrique Guimarães Barbezan, a cela era pequena, sem condições mínimas de higiene para ela e para o recém-nascido. “Pedi o relaxamento do flagrante, mas a Justiça negou o pedido. Ela tem direito a prisão domiciliar, mas isso também foi negado”, disse o advogado.

Conselheiro do Condepe defende prisão domiciliar

Segundo o conselheiro do Conselho Estadual de Defesa dos Direitos da Pessoa Humana (Condepe) Ariel de Castro Alves, Jéssica foi presa com maconha e não tem passagem policial.  “Ela é primária, tem bons antecedentes, tem um filho de 3 anos e o recém-nascido. Por essa condição ela tem direito à prisão domiciliar e a responder pelo crime em liberdade provisória, de acordo com o estatuto da primeira infância. São flagrantes às violações de direitos humanos”, disse Alves. “Por mais que os policiais tenham se esforçado para garantirem condições adequadas de alimentação e higiene, o ambiente da carceragem é precário. É uma carceragem para presos do sexo masculino, ex-policiais, agentes penitenciários, seguranças. São presos que não podem ser mantidos em prisões comuns”, disse Alves.

A prisão

A prisão de Jéssica ocorreu em uma casa antiga, dividida por várias pessoas, na região central de São Paulo. De acordo com o boletim de ocorrência, a polícia apreendeu quatro porções de maconha que estavam escondidas no sutiã de Jéssica e outras 23 porções que os policiais militares disseram que ela jogou no chão antes da abordagem. Na mesma ocorrência, os policiais prenderam Oziel Gomes da Silva com quatro porções de maconha em sua bermuda, outros 37 pacotinhos da droga estavam em sua casa e também 40 doses de cocaína, além de frascos vazios de lança perfume. Na casa dele também foram apreendidas duas espingardas e oito munições. Os dois foram levados para a delegacia como sendo a mesma ocorrência. O advogado de Jéssica diz que ela nega que estivesse com o homem. Segundo ele, os policiais encontraram três porções de maconha - que ela informou serem para consumo próprio - no quarto dela. No quintal da casa, policiais encontraram cerca de 27 porções e disseram que pertenciam a Jéssica também, mas ela negou.
Ainda segundo a defesa, ao sair da casa de Jéssica, policiais encontraram no meio da rua um homem com frascos vazios de lança perfume e porções de maconha, e os dois foram levados para a delegacia como sendo a mesma ocorrência.

Juiz mantém prisão por ver 'alta periculosidade'

O juiz Claudio Salvetti D'Angelo, que fez a audiência de custódia, considerou a materialidade da prisão em flagrante e a converteu para prisão preventiva. "É evidente que a grande quantidade e diversidade de entorpecente encontrada, supõe a evidenciar serem os averiguados portadores de personalidade dotada de acentuada periculosidade. Além disso, não exercem atividade lícita comprovada."
O advogado de defesa de Jéssica disse que informou ao juiz que ela estava em trabalho de parto e mesmo assim não considerou as medidas legais previstas para proteger a criança.