1,5 mil políticos com ficha suja podem voltar a concorrer nas Eleições 2020

As eleições de 2020 podem marcar o retorno de 1,5 mil políticos condenados por ficha suja à vida pública, aponta levantamento inédito da agência Fiquem Sabendo. Resultado de uma mobilização popular que contou com assinatura de mais de 1 milhão de cidadãos para obter aprovação no Congresso Nacional, a Lei da Ficha Limpa (Lei Complementar nº 135/2010) completa 10 anos neste dia 4 de junho. 
Pela norma, que foi sancionada pelo então presidente Luiz Inácio Lula da Silva em 2010, tornam-se inelegíveis por oito anos os políticos condenados em processos com trânsito em julgado ou decisão por órgão colegiado. Como a Lei da Ficha Limpa foi aplicada pela primeira vez em 2012, muitos dos que tiveram inelegibilidade determinada à época deixam de ser enquadrados como ficha suja para fins de registro de candidatura em 2020 e podem estar aptos a concorrer no próximo pleito outra vez.
O Tribunal de Contas da União (TCU) deve oferecer uma lista atualizada de pessoas com contas julgadas irregulares para fins eleitorais ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE) até o dia 5 de julho do ano da eleição, mas o site do TCU mantém uma lista de contas irregulares atualizada para consulta. A partir dessa lista, é possível ter uma ideia de políticos cuja condenação terá expirado até a data de registro de candidaturas, prevista para 15 de agosto. Veja quem são os fichas sujas liberados para se candidatar em 2020 na sua cidade.
RJ e SP têm mais fichas sujas elegíveis novamente
No total, serão 1.565 fichas sujas liberados para se candidatar em todo o país, pelos critérios de reprovação de contas. O Rio de Janeiro, com 160, e São Paulo, com 138, são os Estados com mais potenciais candidatos com ficha suja voltando às urnas este ano, seguidos pela Bahia (99), depois Minas Gerais e Distrito Federal, ambos com 98 políticos com prazo de inelegibilidade expirado. Há possibilidade de alguns desses políticos terem sua situação reavaliada pelo TCU até agosto, o que os manteria inelegíveis por mais tempo.
No conjunto das condenações, no entanto, São Paulo e Rio de Janeiro ficam atrás do Maranhão, que tem o maior número de inelegíveis pelas regras da Lei da Ficha Limpa, mesmo tendo um eleitorado três vezes menor do que São Paulo: são 706 políticos maranhenses listados como irregulares pelo TCU, dos quais 93 podem estar aptos a concorrer este ano, caso não sofram novas condenações. A região Nordeste concentra 39% dos fichas sujas no país.
Inclusão na lista não garante inelegibilidade
À agência Fiquem Sabendo, o TCU esclareceu que a inclusão na lista de pessoas com contas julgadas irregulares não garante a inelegibilidade de responsáveis por essas contas, cabe à Justiça Eleitoral a interpretação da lei na hora de aprovar ou não o registro de candidaturas. E há variáveis que incidem no próprio curso da campanha eleitoral.
“O candidato pode estar inelegível no dia em que pede o registro, venha a conquistar a elegibilidade no curso da campanha eleitoral e dispute a eleição, ou ainda, se estiver elegível no ato do registro e se tornar inelegível no meio do processo eleitoral, por uma nova decisão colegiada, a Justiça Eleitoral pode não conseguir tirá-lo da disputa”, explica Silvana Góes, professora da Fundação Getúlio Vargas e procuradora regional eleitoral do Rio de Janeiro.
A procuradora esclarece ainda que há outras inelegibilidades previstas na Lei da Ficha Limpa, que podem ter origem em uma condenação criminal ou cível, além de contas julgadas irregulares.
Na campanha presidencial de 2018, a aplicação da Lei da Ficha Limpa se tornou tema-chave, quando a candidatura de Lula à Presidência era cogitada pelo Partido dos Trabalhadores (PT). A decisão do STF de eliminar a possibilidade de prisão até que se esgotem todos os recursos saiu apenas em 2019, mas mesmo com a prisão revogada, a condenação pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4) no caso do tríplex do Guarujá impediu a candidatura do ex-presidente.
Memória curta?
Como os primeiros a terem inelegibilidade expirada podem retornar em uma eleição municipal, onde fatores pessoais muitas vezes são mais decisivos para o voto, 2020 será o grande teste dos efeitos da Lei da Ficha Limpa a longo prazo, como observa a procuradora Silvana Góes: “O fato da lei ter criado um conceito jurídico de ficha limpa não significa que o eleitor deve deixar, por conta dessa estrutura institucional, o seu conceito de qual é o melhor político, cada eleitor deve ter para si um conceito de ficha limpa e ficha suja”.
Para Silvana, o balanço da primeira década de aplicação da norma é positivo, embora tenha ocorrido certo afrouxamento nos últimos anos. “No início, o Supremo Tribunal Federal teve bastante rigor na interpretação dessa lei, mas nos últimos anos tem havido flexibilização, como o Supremo considerar que prefeitos de cidades pequenas só serão inelegíveis se tiverem contas reprovadas pela Câmara de Vereadores, ou em casos de improbidade administrativa só se for condenado em dois artigos”, exemplifica.